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21/10/2016
Meritocracia.
Por Valdemar Pinho


Alguns amigos de direita (sim, eu tenho vários amigos de direita) argumentam que a proposta do Temer que quer “tirar o Brasil do vermelho” respeita o princípio democrático da meritocracia. Segundo eles a intervenção dos governos petistas, com programas de transferência de renda e de inclusão social, fere esse princípio. Esses programas e ações obrigam o Estado a investir os recursos de impostos pagos por todos em benefício de milhões de incapazes de competir no mercado. Os mais radicais chamam estes de vagabundos, mesmo. O problema é mais complexo, a começar pelo “todos” que pagam impostos. Alguns dados que constam do meu artigo “Impostura”, publicado no Diário de 29/07/2016, demonstram que os que têm os menores rendimentos são os que mais pagam impostos e o percentual pago diminui progressivamente com o aumento da renda, até chegar próximo de zero para as 100 maiores empresas. Mas, essa não é a questão central, e sim, a meritocracia.

Segundo a Wikipédia, atualmente a palavra "meritocracia" costuma ser frequentemente usada para descrever um tipo de sociedade onde riqueza, renda e classe social são determinadas através de competição e é usada para descrever sociedades agressivamente competitivas, com grandes diferenças de renda e riqueza, em contraste com sociedades igualitárias. Para abordar tema tão complexo, o livro “Igualdade e Meritocracia: A Ética do Desempenho nas Sociedades Modernas”, de Lívia Barbosa, 1ª edição de 1999, é um extenso estudo comparativo da meritocracia nos EUA, no Japão e no Brasil, incluindo entrevistas e uma boa introdução aos conceitos. A autora é doutora em Antropologia Social pela UFRJ, com pós-doutorado na Universidade de Tóquio.

Conceitos meritocráticos aplicados à seleção de funcionários públicos já existiam na China desde 206 A. C., passando pelo Japão desde o início do século XVIII, mas a defesa da ideologia meritocrática, aplicada a todos e tudo, se inicia com a Revolução Francesa. A hierarquia na sociedade passaria a ser definida exclusivamente pelo desempenho individual, em oposição ao sistema que valorizava a “herança, relações pessoais e consanguíneas, privilégios corporativos, poder econômico e político” O termo Meritocracia foi utilizado pela primeira vez em 1958 por Michael Young, no livro “Levantar da Meritocracia”, embora o texto faça várias ressalvas a ela. Mas, comparando com a possibilidade de mobilidade social em sistemas anteriores ao capitalismo a meritocracia pressupõe igualdade formal perante o mercado e as leis. “Nessa perspectiva alia igualdade de oportunidades a eficiência na seleção de pessoas e a democracia. Portanto, a meritocracia é um sistema essencial às sociedades democráticas modernas e igualitárias”. Quem poderia ser contra esse conceito?

No entanto, o que vemos é que “na prática tudo se complica, pois as definições, os critérios e as categorias que determinam o que é desempenho e o que é igualdade, as razões que levam as pessoas a ter desempenho variado, o que fazer com os que foram excluídos do sistema, qual o peso e o valor social do desempenho passado etc, está imbricado e relacionado nas sociedades. E, decorridos alguns séculos após o surgimento da meritocracia como valor cultural das sociedades modernas, seus dilemas e paradoxos se tornaram mais evidentes. Ela termina por gerar desigualdades sociais”. “De uma forma de combater privilégios e injustiças se converte numa ideologia que confere honra, status e prestígio excessivos a determinados indivíduos e reserva punição severa para outros em consequência de seus fracassos. De mecanismo de combate à discriminação social no passado, a meritocracia se torna o critério de discriminação social nas sociedades modernas.” Como atender aos princípios meritocráticos e não gerar desigualdades exacerbadas? Continua na próxima semana.

 

Pinho é médico - Ex-vice-prefeito de Botucatu
Artigo publicado no jornal Diário Botucatu (21/10/2016) 




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